ACMA | SENTIMENTOS

21:00 Joana Santos 11 Comments

Uma das grandes resoluções para o ano de 2017 é abraçar novos projectos: projectos que me façam sentir realizada, apaixonada, capaz. Projectos que mê dêem vontade de ligar o computador, pesquisar e escrever. No fundo, projectos a que tenha vontade de me dedicar de coração. Por isso, há umas semanas, entrei em contacto com a simpática Ju, do blogue Cor Sem Fim, e perguntei-lhe se podia participar no seu maravilhoso projecto: A Cultura Mora Aqui (ACMA). 



Ora, o que é isto do ACMA? Acho que posso afirmar com certeza que todos nós, de uma maneira ou de outra, sentimos, pelo menos uma vez na nossa vida de atarefados bloggers, que há muito mais interacção em blogues de moda e lifestyle: estes são os blogues mais lidos, mais vistos e aqueles que conseguem fazer quantidades exorbitantes de dinheiro através de artigos patrocinados e histórias que tais. Pois bem, o ACMA pretende romper com a corrente e trazer mais cultura para a blogosfera. Aqui há espaço para cinema, música, livros, séries e tantas outras coisas interessantes que preenchem o nosso dia a dia. Porque nem tudo tem de ser sobre sapatos e maquilhagem.

Interessante, hein

Em cada mês há um novo tema de que os participantes falam. Para este mês de Fevereiro, o mês do amor e o mês da minha primeira publicação para o ACMA, nada melhor do que escrever sobre SENTIMENTOS.

Para mim, o que mais me fascina neste tema não é só a pluralidade de sentimentos que habitam os nossos dias e, no geral, a nossa vida, mas sobretudo a forma como esses mesmos sentimentos chegam até nós e nos agitam, nos estimulam e nos fazem sentir. (Quem já me lê há muito tempo, sabe que "sentir" é, provavelmente, a palavra mais usada nos meus textos.)

Se nos mantivermos atentos, há tanto sentimento a cada segundo: a raiva, a paz, a tristeza, a dúvida, a felicidade, a amizade, o amor. Tanto amor. E todos eles nos chegam de todo o lado: uma mensagem de boa noite, um carinho, um sorriso de um estranho, uma pergunta colocada no momento certo, uma palavra ríspida de alguém de quem gostamos ou de quem não gostamos nada, uma frase perdida num livro que lemos, um acorde de guitarra da nossa música preferida.

E depois há aqueles sentimentos inesperados que nos caem do céu através das formas mais estranhas: aquelas onde nunca pensámos encontrá-los.


Há menos de um mês, decidi passar um domingo enfiada em Brick Lane. Brick Lane é um dos sítios mais bonitos de Londres: fica no este da cidade e destaca-se pelas suas lojas de roupa vintage, os seus alfarrabistas carregados de palavras antigas, os restaurantes de muitas partes do mundo, e, sobretudo, pelos milhares de graffiti que cobrem cada centímetro das ruas. Foi exactamente aí que percebi a quantidade de sentimento que a arte urbana carrega. Decidi acompanhar uma excursão pelas ruas e deliciar-me com as explicações da simpática guia francesa. Não decorei o nome dela (vamos chamar-lhe Julie), mas a paixão com que falava de cada stencil, de cada tag, de cada pintura deliciava qualquer um. Apaixono-me pelas paixões dos outros e foi isso que aconteceu ali: ao ver os graffiti pelos olhos da guia francesa compreendi um bocadinho mais sobre arte e descobri que há sentimentos escondidos em cada pincelada. 


Os artistas de rua, os graffiters, afirmam destacar-se dos vândalos porque arriscam-se em nome da sua paixão: não pretendem colocar o seu nome nas paredes, mas sim incitar ao debate, fazer pensar, desafiar as regras de uma sociedade organizada. É isto que Brick Lane nos transmite: em cada parede há uma questão a ser colocada, em cada tijolo há um desenho que nos faz pensar, em cada stencil uma sensação que nos percorre a espinha e, muitas vezes, deixa-nos com pele de galinha. Caras de políticos que se beijam na boca, uma despedida sentida a Prince, o monstro do capitalismo que devora moedas. Raiva, coragem, frustração, nostalgia. O abstracto a tomar forma e a ganhar cor. 


Julie falou-nos de Milo Tchais, um artista brasileiro, de Otto Schade, chileno, e de Ben Slow, britânico. Contou-nos as histórias de cada um e de muitos mais graffiters. Falou-nos de conversas que tiveram, de histórias que partilharam, de pinturas que fizeram e da forma como cada um deles ama aquilo que faz. Irreverentes. Livres. Sem medos. Os olhos brilhavam-lhe enquanto falava. 


Enquanto seguia a excursão, apreciava cada obra de arte e compreendia: o verdadeiro significado de cada graffiti eu nunca vou saber. Cada um deles esconde-se atrás de um manto de subjectividade. Aquilo que vejo em cada pedaço de cor é o que eu sinto dentro do meu coração: é aquilo que tenho dentro de mim. Um graffiti é, por isso, um espelho: um espelho que racionaliza aquilo que me faz sentir, um espelho que me ajuda a compreender os meus pensamentos mais profundos. O graffiti é, assim, uma viagem pelo interior de cada um de nós. 


E não será esse o objectivo final da arte? Compreender. Descobrir. Supreender. E, mais do que tudo, sentir. 


Blogues Participantes 


Blogues & Youtube Convidados


E tu? Também gostavas de participar neste projecto? Se a resposta for positiva, então não esperes mais: envia já um e-mail para a Ju, através do correio electrónico corsemfim@gmail.com. Já sabes, não falaremos de moda nem acessórios, mas daremos banhos de cultura ao mundo dos blogues e bloggers. Ah, muito importante: se és Youtuber não te acanhes. Também tu podes participar neste projecto! 


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As pessoas que não são nossas

22:05 Joana Santos 9 Comments


Acredito que todos aqueles que se cruzam connosco, ao longo desta nossa vida, aparecem com um propósito e ficam exactamente o tempo necessário para nos ensinar uma lição ou para nos levar até ao próximo patamar do nosso caminho. Há quem fique para sempre e há quem apenas nos acompanhe durante breves segundos, instantes onde trocamos olhares que falam sem voz. Seja como for, mais cedo ou mais tarde, descobrimos o propósito de cada pessoa, o porquê de ela ter aparecido - mais ou menos de surpresa. Demorou até que me apercebesse disso: há coisas que, provavelmente, só nos damos conta de que são como são com o passar dos anos. Já chorei muito por ver alguém partir, desaparecer da minha vida sem deixar qualquer rasto. Por vezes, a tristeza era tão grande que tentava a todo o custo voltar atrás no tempo, impedindo a pessoa de ir embora. Por causa disso, sei que levei muita gente à exaustão. A verdade, é que o apego e a dependência eram de tal modo fortes que, acreditava eu, não conseguiria sobreviver sem determinada presença no meu dia-a-dia. Um dia, depois de muitas lágrimas e de um coração constantemente em sofrimento, com medo de perder mais alguém, dei-me conta de que quanto mais forçava a presença de alguém na minha vida, mais sozinha me sentia, menos longe chegava, menos feliz estava. Lembro-me exactamente do momento em que, perdida nestes pensamentos, me propus a um desafio. Aconteceu durante uma viagem de barco entre o Barreiro e Lisboa, bem cedo, antes das aulas. Estava no final do primeiro semestre do primeiro ano da faculdade e sentia que tinha perdido todos os meus amigos, um namorado de quase três anos e, acompanhando a minha mudança de cidade, até a minha identidade tinha ido pelo cano abaixo. Mas, afinal, que desafio foi este? Simples: em apenas 25 minutos, a duração da travessia do Tejo, fiz uma lista de todas as pessoas que tinham passado pela minha vida, que eu achava que tinha perdido, e, em vez de as ver realmente como uma perda, escrevi à frente do nome de cada uma todas as coisas boas que trouxeram à minha vida. Fi-lo intuitivamente: não pensei que este pequeno desafio me levasse tão longe. Depois disso, foi mais fácil aceitar a partida de cada uma delas. Diria mesmo que - reconheço agora - foi nessa altura que perdoei muitas delas e me perdoei a mim também. Demorou até interiorizar os ensinamentos que esse dia me trouxe: foram precisas muitas mais decepções e lágrimas, muitas aulas de yoga para retirar o peso de cima dos ombros, muitas meditações em que a minha garganta se ressentia por todas as palavras que tinham ficado por dizer. Foi preciso uma viagem para um país estrangeiro. Sentir-me sozinha e perceber que a vida é um conjunto de surpresas felizes. Foi preciso, talvez até, chegar aqui. Ao momento presente. Ao momento em que escrevo estas palavras. Talvez ainda não tenha entendido completamente o significado que esse dia teve para mim. Talvez precise ainda de muitas mais listas, cheios de nomes de vidas que se cruzam na minha. Talvez seja uma apredizagem constante. Mas fica cada vez mais fácil: fica mais fácil quando percebemos que as pessoas não são nossas. Quando compreendemos as mensagem que cada uma delas nos traz. Quando olhamos para o passado e descobrimos que, sem elas, nao estaríamos aqui, mas que, ainda com elas, também não tínhamos chegado. Hoje, já não choro. Mas ainda dói quando me dou conta de que o tempo não volta para trás. Mas será que queria realmente que voltasse? Sei que não. Sei que todos os que saíram não deixaram de fazer parte de mim. Sei que carrego comigo um pedacinho de cada ensinamento por eles deixado. E sei que é porque uns partem que outros chegam, para abrir novas janelas dentro de mim e me dar a conhecer novos tons de cores que antes não conseguia ver. Por isso, agradeço: aos que foram, aos que ficam, aos que chegam e àqueles que ainda hão-de chegar. Porque a vida não traz nem leva nada que não estamos preparados para receber ou deixar ir. Porque nada acontece por acaso. 

Com amor,
Joana


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