As pessoas que não são nossas

22:05 Joana Santos 9 Comments


Acredito que todos aqueles que se cruzam connosco, ao longo desta nossa vida, aparecem com um propósito e ficam exactamente o tempo necessário para nos ensinar uma lição ou para nos levar até ao próximo patamar do nosso caminho. Há quem fique para sempre e há quem apenas nos acompanhe durante breves segundos, instantes onde trocamos olhares que falam sem voz. Seja como for, mais cedo ou mais tarde, descobrimos o propósito de cada pessoa, o porquê de ela ter aparecido - mais ou menos de surpresa. Demorou até que me apercebesse disso: há coisas que, provavelmente, só nos damos conta de que são como são com o passar dos anos. Já chorei muito por ver alguém partir, desaparecer da minha vida sem deixar qualquer rasto. Por vezes, a tristeza era tão grande que tentava a todo o custo voltar atrás no tempo, impedindo a pessoa de ir embora. Por causa disso, sei que levei muita gente à exaustão. A verdade, é que o apego e a dependência eram de tal modo fortes que, acreditava eu, não conseguiria sobreviver sem determinada presença no meu dia-a-dia. Um dia, depois de muitas lágrimas e de um coração constantemente em sofrimento, com medo de perder mais alguém, dei-me conta de que quanto mais forçava a presença de alguém na minha vida, mais sozinha me sentia, menos longe chegava, menos feliz estava. Lembro-me exactamente do momento em que, perdida nestes pensamentos, me propus a um desafio. Aconteceu durante uma viagem de barco entre o Barreiro e Lisboa, bem cedo, antes das aulas. Estava no final do primeiro semestre do primeiro ano da faculdade e sentia que tinha perdido todos os meus amigos, um namorado de quase três anos e, acompanhando a minha mudança de cidade, até a minha identidade tinha ido pelo cano abaixo. Mas, afinal, que desafio foi este? Simples: em apenas 25 minutos, a duração da travessia do Tejo, fiz uma lista de todas as pessoas que tinham passado pela minha vida, que eu achava que tinha perdido, e, em vez de as ver realmente como uma perda, escrevi à frente do nome de cada uma todas as coisas boas que trouxeram à minha vida. Fi-lo intuitivamente: não pensei que este pequeno desafio me levasse tão longe. Depois disso, foi mais fácil aceitar a partida de cada uma delas. Diria mesmo que - reconheço agora - foi nessa altura que perdoei muitas delas e me perdoei a mim também. Demorou até interiorizar os ensinamentos que esse dia me trouxe: foram precisas muitas mais decepções e lágrimas, muitas aulas de yoga para retirar o peso de cima dos ombros, muitas meditações em que a minha garganta se ressentia por todas as palavras que tinham ficado por dizer. Foi preciso uma viagem para um país estrangeiro. Sentir-me sozinha e perceber que a vida é um conjunto de surpresas felizes. Foi preciso, talvez até, chegar aqui. Ao momento presente. Ao momento em que escrevo estas palavras. Talvez ainda não tenha entendido completamente o significado que esse dia teve para mim. Talvez precise ainda de muitas mais listas, cheios de nomes de vidas que se cruzam na minha. Talvez seja uma apredizagem constante. Mas fica cada vez mais fácil: fica mais fácil quando percebemos que as pessoas não são nossas. Quando compreendemos as mensagem que cada uma delas nos traz. Quando olhamos para o passado e descobrimos que, sem elas, nao estaríamos aqui, mas que, ainda com elas, também não tínhamos chegado. Hoje, já não choro. Mas ainda dói quando me dou conta de que o tempo não volta para trás. Mas será que queria realmente que voltasse? Sei que não. Sei que todos os que saíram não deixaram de fazer parte de mim. Sei que carrego comigo um pedacinho de cada ensinamento por eles deixado. E sei que é porque uns partem que outros chegam, para abrir novas janelas dentro de mim e me dar a conhecer novos tons de cores que antes não conseguia ver. Por isso, agradeço: aos que foram, aos que ficam, aos que chegam e àqueles que ainda hão-de chegar. Porque a vida não traz nem leva nada que não estamos preparados para receber ou deixar ir. Porque nada acontece por acaso. 

Com amor,
Joana


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9 comentários:

  1. É muito difícil praticar o desapego principalmente quando temos de nos desapegar de filhos.
    Uma boa jornada para si Joana :) Eu também vou aprendendo cada dia e talvez a tal lista seja uma boa ideia <3

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  2. Uau! Uau. UaaaaAaau. É que não escreveria melhor sobre isto. Felizmente ou não, já fizera esta descoberta há muitos anos. Não é que se tenha tornado fâcil desapegar-me de alguém, mas aceito com facilidade que determinada pessoa precise de seguir um caminho diferente do meu. Desde cedo qe aceitei. Tive de o fazer. E, por esta razão, agradeço ao meu passado por me ter feito ver isto ligeiramente mais cedo... sofri sim, mas, pelo menos neste campo, sabia lidar com esse sofrimento.
    Beijo gigante :)

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  3. Olá Joaninha minha querida!
    Gostei tanto mas tanto de ler estas tuas palavras. Tocaram-me mesmo no coração!
    A vida é assim mesmo, resolve-se por si, leva-nos e traz-nos as coisas e as pessoas conforme as nossas necessidades!
    Esta foi uma lição que há aprendia há algum tempo. Confesso que foi daquelas lições que me custou um bocadinho para interiorizar.
    Não há nada na vida que não nos aconteça, para o qual nos estejamos preparados! Acredita nisso minha linda! Somos sempre mais fortes do que aquilo que nos julgamos ser. E como já disse anteriormente, a vida acaba sempre por se resolver e nos levar para o destino certo!
    Beijinho grande grande**

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  4. Excelente texto, minha querida! Não podia estar mais de acordo com a ideia de base.
    Dói quando vemos alguém de quem gostamos sair da nossa vida. E o mais comum é olharmos para isso como uma perda, porque, de facto, não deixa de o ser. Perdemos um suporte, uma companhia, um pedaço do nosso coração. Contudo, temos mesmo que aprender a não nos apegarmos ao ponto de nos tornarmos dependentes delas, porque aí sofreremos muito mais. Claro que custará olhar para o lado e perceber que aquela pessoa já não está, mas se nos focarmos em tudo aquilo que ela nos trouxe de bom é mais fácil para encontrarmos um pouco de paz

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  5. E ficam esses bocadinhos em nós... muita força linda.

    Beijinhos,
    O meu reino da noite ~ facebook ~ bloglovin'

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  6. Todas as pessoas que passam por nós deixam-nos sempre alguma coisa, nem que seja o mais infimo ensinamento. <3

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  7. O que escreves já aconteceu a muita gente, a mim, inclusive. Houve uma altura em que eu me sentia completamente sozinha e realmente, estava. Com a minha mudança para Londres, todos os meus amigos ficaram em Portugal mas de certa forma eu afastei-me e não "insisti" nas amizades que tinha. Quando regressei é que dei conta do grande erro que tinha cometido. No entanto, de alguma forma e já não sei bem como, todas essas amizades que eu julgava ter perdido, voltaram a unir-se. Agora eu dou muito mais valor àquelas minhas amigas que amo de coração e faço de tudo para que elas não me larguem e eu também não.

    Porque mesmo que nós sejamos uma pessoa individual, somos também uma criação de várias pessoas e o que somos, devemos a um trabalho com mérito pessoal mas também às pessoas que passaram, passam e estão connosco.

    Cátia ∫ Meraki

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  8. De uma forma tão simples, foste capaz de fazer um balanço tão lindo....Adorei

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